Por que podemos ingerir alguns alimentos com fungos e outros não?

 Não…você não pode comer o queijo mofado da sua geladeira e ele não tem nada a ver com o queijo gorgonzola!


Imagem do emoji de queijo amarelo cheio de furinhos. Fonte: https://emojipedia.org/pt/apple/ios-12.1/queijo

No semestre passado na minha faculdade, precisamos fazer um seminário interdisciplinar com algum tema dentro da microbiologia dos alimentos, eu estava prestes a falar sobre o ovo pasteurizado, mas após ver os vídeos do Fusqueijão no Youtube tentando desmistificar os queijos com fungos, eu pensei: “Porque não pesquisar sobre isso?”

Provavelmente muitos de vocês já se depararam com alguma pessoa surtada das ideias falando algo como: “Porque eu não posso comer esse queijo mofado da minha geladeira? Existem queijos com mofo para vender por aí” e você acaba rolando os olhos forte o suficiente para que fiquem doendo e sabem que falar: “Porque faz mal” nunca coloca noção na cabeça da pessoa, então, motivada por isso, surgiu um artigo de 10 páginas sobre isso no meu seminário que revelarei para vocês da forma mais resumida possível.

O queijo é um dos alimentos mais produzidos no Brasil, podendo ser produzido com leite pasteurizado e vendido comumente em qualquer lugar dentro de embalagens de plástico, caixas ou papel alumínio nos refrigeradores e prateleiras acompanhado de outros produtos de fiambreria ou dentro de balcões apropriadamente climatizados em padarias, onde o consumidor pede quantas gramas ele desejar. Porém, nós sabemos que esses não são os únicos queijos produzidos e existentes no país e no mundo, o artigo de Antunes em 2023 nos mostra que alguns queijos denominados especiais são inspirados em receitas vindas de outros países como França e Itália, onde suas receitas foram trazidas por pessoas imigrantes.

Queijos como Gorgonzola, Roquefort e Brie são receitas especiais que tem características diferentes dos queijos que encontramos nos mercados, pois esses são feitos com leite pasteurizado, já os queijos especiais são produzidos com leite cru e alguns possuem a presença de microrganismos que ajudam a dar sabor para eles, isso também traz um cheiro e um aspecto físico que chama a atenção dos consumidores, que tem um grande interesse por esses tipos de queijo por causa da aparência, que variam em serem mais rígidos, contendo uma coloração mais amarelada ou mais clara, muitos tem um aspecto cremoso quase como um requeijão e com um cheiro e gosto mais fortes que acompanham um bom vinho.

Todos estão carecas de saber que os queijos especiais tem fungos e mofos presentes na sua fabricação, alguns fazem parte da área externa do queijo, o que traz muitos questionamentos para a população, afinal, foi ensinado para todos nós, que os fungos e os mofos causam problemas gastrointestinais e respiratórios para nós, em alguns casos, eles se tornaram um grande indicativo de que o produto não está adequado para ser consumido. Por essa razão, acredito que seja importante deixar claro o motivo de alguns queijos produzidos com fungos e mofos poderem ser comidos e vendidos tranquilamente, enquanto fungos e mofos em queijos pasteurizados indicam que o produto está estragado, porque para muitos podem não haver diferença, mas a verdade é que existem muitos fatores por trás dessa diferenciação.

Eu analisei vários artigos encontrados no Google Acadêmico, postados no SciElo e alguns consegui através da ajuda do meu professor-orientador da faculdade, e de certa forma, se tornou notável que no Brasil, não existe uma legislação que seja específica para queijos especiais ou considerados artesanais, mas mesmo assim, existe a fabricação em massa desses produtos e muitas pessoas com um poder aquisitivo maior, vocês sabem o que estou querendo insinuar, procuram por queijos tipo Brie, Roqueforti, Camembert e Gorgonzola por serem produtos diferentes com sabores diversos, afinal, eles tem características físicas que chamam a atenção, como aspecto cremoso, esporos de mofo branco na casca, e geralmente, esses queijos especiais, costumam ser mais caros do que os queijos comuns comprados em bandeja na fiambreria.

Também sabemos que boa parte da população não tem conhecimento sobre esses queijos e sobre os microrganismos que modificam a aparência, gosto e cheiro deles, porque para as pessoas em geral, fungos e mofos significa que aquele produto não está apto para consumir e podem causar problemas gastrointestinais e infecções estomacais, por esse motivo, o povo tem medo de experimentar as variedades de queijos, independente do valor que eles custem, e infelizmente temos uma parcela das pessoas que acreditam fielmente que podem comer qualquer queijo mofado e com fungos na sua geladeira de casa por causa da existência dos queijos especiais também.

Nesses artigos, eu encontrei alguns pontos importantes que ajudam a ressaltar a diferença entre os fungos e explicar o motivo dos queijos especiais poderem ser comidos sem causar problemas no seu intestino, e o principal, se refere que diferente dos fungos e mofos que se tornam presentes em outros tipos de queijo, as espécies e o surgimento desses microrganismos são diferenciados entre si.

Sobral e seus colegas de artigo, em 2017 mostrou que ao produzir um queijo artesanal, o leite não pode ser pasteurizado ou passar por qualquer procedimento padrão que é usado quando se fabrica produtos industrializados, porque o leite é a matéria-prima principal da fabricação do queijo e alguns precisam estar em diferentes temperaturas e estar em um processo físico-químico diferente, além que as estações do ano influenciam muito nessas fabricações, por isso que a pessoa responsável pela fabricação dos queijos, no caso do artigo, ele se referia ao Queijo Minas Frescal, precisa ter cuidado quando for fabricar os queijos, porque esse tipo de produto tem que ter as tecnologias necessárias e levar a temperatura e as estações em consideração.

Os autores ainda reforçaram que os mofos não são os agentes patógenos dos alimentos, ou seja, eles não são os responsáveis por causar os problemas de saúde, os responsáveis de verdade são os metabólicos secundários que são conhecidos como micotoxinas, eles seriam os causadores dos efeitos colaterais que o corpo tem depois que ingerimos eles.

E tem mais! Alguns fungos filamentosos são usados para fabricar outros tipos de queijo como o Penicillium camembert que é usado nos queijos Brie e Camembert, e o Penicillium roqueforti que é usado nos queijos Roquefort e Gorgonzola.

Pereira e seus colegas de artigo em 2018 afirmaram que existem muitas espécies de fungos diferentes que a população não tem conhecimento sobre eles, inclusive, existem muitos estudos que relatam existir mais de 2000 espécies de fungos comestíveis, mas infelizmente no nosso país, não temos uma confirmação da quantidade de fungos comestíveis que existem, porque não temos muito conhecimento sobre os microrganismos, mesmo assim, eles reforçam que independente de não termos levantamentos precisos, existem cerca de 150 a 264 mil espécies de fungos, mesmo que não tenham especificado quantos desses microrganismos seriam comestíveis ou não.

Além disso, eles também relataram que é muito importante ter cuidado ao consumir fungos, usando o exemplo do cogumelo, os autores dissertaram que a origem do fungo é essencial para saber se pode ser consumido ou não, porque esses microrganismos correm o risco de serem mais prejudiciais se crescerem em ambientes perto de estradas ou rodovias por exemplo, pois nas estradas, tem concentração de elementos prejudiciais e não-naturais para o corpo humano como metais pesados presentes nos asfaltos, assim como fungos presentes em locais com agrotóxicos, que também são substâncias químicas que causam problemas de saúde, então o queijo mofado na bandeja do mercado ou dentro da sua geladeira está em contato com vários elementos presentes no ambiente que podem ser prejudiciais e vir de animais, de outras embalagens e até mesmo do próprio ar que respiramos.

Os fungos presentes nos queijos especiais são controlados e domesticados nas fábricas com o cuidado de não se tornarem indesejáveis ao corpo humano, precisam estar em lugares específicos e fechados sem contato com o meio externo, e mesmo assim, por estarem em alimentos, muitos produtos contendo alguns fungos, principalmente queijos que contenham Penicillium camembert e Penicillium candidum, o último citado sendo uma variação do Camembert, agindo juntos para a produção do queijo, ainda assim correm um alto risco de se contaminarem durante o processo de produção.

Ou seja, mesmo que existam dois tipos de fungos Penicillium usados na fabricação de queijos especiais, ele ainda é um microrganismo que pode prejudicar a saúde do ser humano, porque o gênero é conhecido por causar contaminação alimentar, por exemplo, o Penicillium comune é um deteriorador de alimentos muito importante, em principal, o queijo, inclusive, em queijos que são embalados a vácuo. O artigo de Santos em 2021 disserta que os fungos encontrados no queijo parmesão que costuma estar presente em prateleiras de mercados, em sua maioria, eram pertencentes ao gênero Penicillium, provando que esse microrganismo cresce no ambiente.

Esses fungos podem ser introduzidos na fabricação do queijo de formas diferentes: O queijo Camembert e o queijo Brie tem os esporos do Penicillium camembert e do Penicillium candidum espirrados no leite cru, criando uma casca com mofo branco e deixando o interior cremoso, diferente do queijo Roquefort e o queijo Gorgonzola, onde o queijo será perfurado para que os fungos necessários se proliferem dentro deles endurecendo a parte interna e criando uma espécie de veias azuladas em sua aparência interna.

Considerando os artigos que usei para a pesquisa desse seminário interdisciplinar, eles indicam que os fungos que estão em queijos especiais são controlados e domesticados por quem os manipula e pelos fabricantes com a intenção de serem usados nos alimentos, isso ajuda a diferenciar como ele parece, o gosto e o cheiro, eles também tem um tempo limite para serem comercializados por causa da deterioração que ainda acontece nos produtos que são mantidos por muito tempo nas prateleiras, o que pede um cuidado maior na fabricação dos queijos especiais para não correr o risco de serem contaminados por outros fungos que estão no ambiente e nos aparelhos que são usados na fabricação, isso exige uma biossegurança no ambiente de manipulação desses produtos, afinal, esses cuidados com os fungos em queijos especiais são essenciais para garantir que o queijo possa ser consumido, porque os manipuladores precisam ter o cuidado de observar os fungos para que eles não acabem se tornando prejudiciais aos consumidores, diferente dos fungos e mofos que se tornam presentes em queijos que são mantidos em prateleiras ou em casa, pois fungos que surgem do ambiente, sem fiscalização e sem um estudo detalhado sobre eles, dependendo das químicas contidas ao redor como remédios, materiais e outras coisas não naturais, podem afetar o alimento porque produzem micotoxinas prejudiciais, fora o fator ambiental que é muito importante.

O ambiente que tem a possibilidade de entrar em contato com químicos, se não for bem esterilizado e não cumprir com as normas básicas de biossegurança, podem contaminar o alimento, nesse caso, é importante ter uma legislação que exija o cuidado com os queijos especiais, porque no Brasil, a legislação exige cuidado dos queijos artesanais e industriais, mas não tem uma legislação rigorosa em queijos especiais.

O que me decepcionou ao pesquisar sobre esse assunto é que existem poucos artigos que falam de forma detalhada e explícita sobre os benefícios dos fungos presentes em queijos especiais como o Camembert, Brie, Roquefort e Gorgonzola, nós falamos muito sobre os malefícios dos fungos e como microrganismos como a Salmonella spp é muito prejudicial a saúde, o que é algo importante de ser realçado, com certeza, mas infelizmente não se tem muitas pesquisas ou resultados sobre os benefícios dos fungos que são utilizados nesses queijos, no meu artigo fiz uma tabela comparativa dos fungos e não encontrei nada que explicasse os benefícios, apenas os malefícios, se tem alguma coisa, a explicação é muito vaga e não tem muitas informações sobre os benefícios desses fungos comestíveis a saúde, mas ainda bem que consegui esclarecer as dúvidas sobre esses microrganismos, afinal, o ambiente, a fabricação, a biossegurança e a validade do produto são fatores essenciais. Então eu aproveito esse final de análise para ressaltar que seria interessante que tivéssemos um debate maior sobre os fungos e mofos que não prejudicam o organismo do ser humano para que possamos definir quais são os benefícios a saúde que eles nos fornecem e as suas características microbiológicas.

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